CHRISTENSEN. Clayton M. DNA do Inovador. ln HSM Management. Jan/Fev/2013. p.94-7.
O lendário líder da Procter &
Gamble, A.G. Lafley, costumava dizer que “inovação é o trabalho central de
todos os líderes, seja o chefe de uma unidade de negócios, um líder funcional
ou o CEO da empresa”. Não é assim, contudo, que a maioria dos líderes costuma
pensar, como confirmamos em oito anos de pesquisas, e o fato é que os
profissionais de perfil inovador frequentemente deixam as empresas.
Ocorre que Lafley está certo, porque
a inovação é mais necessária do que nunca. Será, então, que os líderes mais
“convencionais” que permaneceram no ambiente corporativo conseguem transformar--se
em inovadores? E o que impulsionaria tal transformação? Fomos investigar. A
pergunta inicial foi: “Por que algumas pessoas são mais inovadoras do que
outras?”. E as respostas apareceram:
·
elas confiam em sua “coragem de inovar” –uma
propensão ativa para desafiar o status quo e uma disposição inquebrantável de
assumir riscos inteligentes– para gerar impacto a partir de ideias.
·
para que surjam ideias inovadoras, deve-se ter,
sobretudo, a “competência cognitiva do pensamento associativo”, ou seja, a
capacidade acima da média de fazer associações de ideias.
Em parte, isso explica por que o
cérebro delas funciona dessa maneira, mas a razão maior é que elas praticam com
frequência quatro competências comportamentais: questionar, observar, fazer
networking e experimentar.
As cinco não são competências do outro
mundo, certo? Então, por que algumas pessoas as empregam muito mais do que
outras? Voltamos ao início: elas têm coragem de inovar, ou seja, estão
dispostas a abraçar a missão de mudar e correr riscos para que mudanças
ocorram.
Analisamos, a seguir, as cinco
competências, uma por uma.
Competências
de descoberta
1.
Associar
Como Steve Jobs disse, criatividade é
juntar ideias. Ele acrescentou que, quando perguntamos a pessoas criativas como
fizeram algo, elas se mostram um pouco culpadas por não tê-lo feito realmente,
mas apenas detectado. “Elas tiveram a capacidade de combinar experiências e
sintetizar coisas novas”, observou Jobs. É assim que os inovadores pensam
diferente, o que chamamos de associação, uma competência cognitiva que é a base
do DNA do inovador.
Quando o cérebro absorve ativamente conhecimentos,
aumentam as possibilidades de criação de ligações entre ideias enquanto ele se
esforça para sintetizar as informações novas. Da mesma forma, o poder de
associação pode ser desenvolvido por meio do uso ativo de perguntar, observar, cultivar
o networking e experimentar.
Em nossa pesquisa, todos os
inovadores de alto nível tiveram índices excelentes em associação, com os inovadores
de processos mostrando competências de associação ligeiramente inferiores às de
inovadores de produtos (mesmo assim, bem superiores às dos não inovadores).
Associações novas permitem chegar a
ideias de negócios disruptivas. Estas surgem de três modos:
1.1.
Criação
de combinações estranhas.
Às vezes, os líderes mais inovadores capturam o que parecem ser
associações muito tênues entre ideias e conhecimentos, misturando e combinando
conceitos muito diferentes. Assim, produzem ocasionalmente ideias incomuns que
podem ser catalisadoras de ideias criativas de negócios. O fundador do eBay,
Pierre Omidyar, tinha conversado com consultores que tentavam resolver o
problema de transportar rapidamente produtos entre as lavouras e os
consumidores. A primeira pergunta que ele fez: “Por que não despachar um pé de
alface pelo correio?”. Omidyar admitiu: “Era uma ideia estúpida, mas um exemplo
de como juntar duas coisas nunca somadas”.
1.2.
Zoom in
e zoom out. Empreendedores inovadores “mergulham” (zoom in) para
compreender as sutis nuanças da experiência particular de um cliente e “voam” (zoom
out) a fim de saber como tais detalhes se encaixam no quadro maior. A síntese
das duas visões leva a associações surpreendentes. Um adepto do uso do zoom in
e do zoom out? Steve Jobs.
1.3.
Pensamento
Lego. Se os inovadores têm algo em comum é adorar colecionar
ideias, como os garotos amam colecionar Lego. Inovadores que participam com
frequência de atividades de indagar, observar, conversar com pessoas e
experimentar se tornam mais capazes de associar, porque desenvolvem
experiências de compreender, armazenar e recategorizar todo o novo conhecimento.
Os inovadores que estudamos raramente inventaram alguma coisa inteiramente
nova; eles combinaram de novas maneiras ideias que haviam obtido.
2.
Questionar
Os inovadores fazem muitas perguntas
para entender melhor o que é e como poderia ser. Ignoram perguntas seguras e
escolhem as que desafiam o status quo. Nossa pesquisa demonstrou que os
inovadores fazem mais perguntas que os não inovadores e fazem perguntas mais
provocativas. Por ter feito muitas perguntas, A.G. Lafley ajudou a virar o jogo
na P&G. Ele começava conversas ou reuniões com perguntas como: “Qual é a
consumidora-alvo deste produto?”; “O que você sabe sobre ela?”; “Qual o tipo de
experiência que ela quer de verdade?”. Depois, mudava a linha do interrogatório
para questões fortes do tipo “e se...”, procurando chegar a inovações centradas
no consumidor. Suspensos confortavelmente entre
a fé e a dúvida em seus mapas, os melhores
inovadores lembram que seus pontos de vista sobre o mundo nunca são territórios
reais. De maneira intuitiva, dependem de uma variedade de perguntas para
desenvolver uma compreensão profunda de como as coisas são de verdade, antes de
testar como poderiam ser: “o que é?”, “qual é a causa?”, “por quê?”, “por que
não?” e “e se...?”.
3.
Observar
Tom Kelley, da empresa de design Ideo
e autor de A Arte da Inovação (ed. Futura), escreveu que a pesquisa do
antropólogo é a maior fonte de inovação em sua empresa. Os antropólogos desenvolveram
técnicas para estudar os seres humanos em seus ambientes naturais e aprender com
seus comportamentos.
Quando os clientes se tornam
conscientes da tarefa que precisam cumprir, olham em volta à procura de um produto
ou serviço que possam “contratar”. Observar alguém em uma circunstância particular
pode levar a percepções sobre a tarefa a ser realizada –e sobre a melhor
maneira de cumpri-la. A experiência de Ratan Tata com o Nano ilustra essa
ideia. Sua observação inicial, de uma família na motoneta sob a chuva, levou-o
a entender que o veículo não cumpria muito bem sua tarefa de transportar a
família de modo seguro e sem deixá-la molhada.
Observar é uma habilidade-chave de
descoberta para a maioria dos inovadores, que tendem a gerar percepções de
negócios a partir de um de dois tipos de observações:
3.1.
Observar pessoas em circunstâncias diferentes ao
tentarem realizar uma tarefa e obter percepções sobre qual é a tarefa que elas
desejam realizar de verdade.
3.2.
Observar pessoas, processos, empresas ou
tecnologias e buscar uma solução que possa ser aplicada (talvez com
modificações) em um contexto diferente.
Enquanto estiver observando
clientes, empresas ou outra coisa qualquer, use mais que um sentido (visão,
olfato, audição, tato, paladar). Isso já foi estruturado no “diálogo no escuro”
(prática desenvolvida por Andreas Heinecke) e no “diálogo no silêncio” (Heinecke
e Oma Cohen), espécies de excursões cujos convidados experimentam ambientes desconhecidos –escurecidos ou
silenciosos.
Um modo menos estruturado de
empregar seus sentidos é conscientizar-se deles. Por exemplo, preste atenção
aos cheiros que sente na próxima vez em que visitar um cliente ou concentre- -se
em como você percebe um produto quando o toca. Enquanto aprende a observar,
aparecerão insights criativos.
4.
Networking
Pensar fora da caixa exige, com
frequência, ligar as ideias de sua área do conhecimento às que estão em ramos
diferentes. Os inovadores ganham uma perspectiva nova quando dedicam tempo e
energia a descobrir e testar ideias por meio de uma rede de pessoas
diversificadas.
Nossa pesquisa revelou que
empreendedores de startup e corporativos são ligeiramente melhores em formar
networking de ideias do que inventores de produtos e bem melhores do que
inventores de processos e não inovadores.
O princípio básico de cultivar uma rede
de ideias é construir uma ponte para uma área de conhecimento diferente interagindo
com alguém com quem você ou seus pares não interagiriam normalmente.
Em mais ou menos metade dos casos
que estudamos, em que ideias novas chegaram por meio do networking, o feliz
empreendedor praticamente tropeçou na ideia. No entanto, pessoas que cultivam
com eficiência networking de ideias também fazem planos para conseguir novas
ideias de modo deliberado, consultando regularmente especialistas de fora de seu
grupo, participando de encontros de networking e formando uma rede pessoal de
confidentes criativos.
Apesar de todos os pontos positivos do
networking com especialistas de outras áreas, Scott Cook, da Intuit, pede cautela,
porque há casos em que conversar com especialistas não é a melhor forma de
gerar inovações. “Alguns problemas e novas ideias de negócios representam uma
mudança de paradigma tão grande que conversar com pessoas reforça o paradigma
atual.” O ponto é que os especialistas também têm seus pontos de vista. Assim,
lembre-se de fazer perguntas contraintuitivas para desafiá-los e ouça suas
respostas com um ceticismo saudável.
5.
Experimentar
Os inovadores de negócios vivem
experiências distintas das do dia a dia e desconstroem produtos e processos em busca
de dados que possam provocar uma ideia. Jeff Bezos, da Amazon, tanto aprendeu
que experimentar é crucial que tentou institucionalizá-lo. “Estimulo os
funcionários a testar. Se você aumenta o número de experiências de cem para
mil, crescem drasticamente as inovações.”
De todas as competências de
descoberta, determinamos que experimentar era o melhor diferenciador entre
inovadores e não inovadores. Assim, se você quiser encontrar alguém com
tendência à criatividade e à inovação, avalie sua competência de
experimentação.
A maioria dos inovadores de nosso estudo
tinha, pelo menos, uma das três maneiras de experimentar:
5.1.
Tentar novas alternativas por exploração direta,
como Jobs fez ao permanecer em um ashram na Índia ou estudar caligrafia.
5.2.
Desmontar coisas, física ou intelectualmente, como
Michael Dell, quando, aos 16 anos, separou as peças de um computador.
5.3.
Testar uma ideia por meio de pilotos e
protótipos, como Michael Lazaridis, o inventor do BlackBerry, ao tentar
construir, na escola secundária, um campo de força semelhante ao da Star
Trek.
Hábitos
de descoberta
Quando praticam ativamente suas competências
de descoberta, as pessoas constroem hábitos de descoberta. E são definidas por
esses hábitos.
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