BARELLA. José
Eduardo. A receita vencedora dos atletas
bisavós. O Estado de S.Paulo. Reportagem
Especial Vida Saudável. p.A18, 8/set/2012
Estudo divulgado neste ano pela
Universidade Harvard, nos Estados Unidos, indica que o sedentarismo estava
relacionado a 5,3 milhões de mortes no mundo em 2008, pelo fato de ser um
facilitador do desenvolvimento de diabete, hipertensão, obesidade e até determinados tipos de
câncer. O número representa 9% das mortes anuais causadas por doenças crônicas
não transmissíveis do planeta, perdendo apenas para o tabagismo.
Classificado há dez anos como doença
pela Organização Mundial de Saúde (OMS), o sedentarismo tem impacto maior na
terceira idade. "O envelhecimento é um processo natural, mas é preciso se
preparar com antecedência", afirma Sandra Matsudo, especialista em
medicina esportiva da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e autora de
vários trabalhos que relacionam envelhecimento e atividade física.
Segundo Sandra, o corpo começa
perder o vigor a partir dos 30 anos. Entre os 50 e 60 anos, a perda de massa
muscular é acentuada, principalmente nos membros inferiores, afetando as
articulações e o equilíbrio. A atividade física nessa faixa etária fortalece o
sistema cardiovascular e combate a osteoporose. "Praticar exercícios é
como fazer uma ‘poupança’ da saúde do corpo", diz.
A maioria, porém, só passa a se
mexer quando as doenças crônicas começam a se manifestar. Foi o que aconteceu
com Mitiko. Até os 54 anos, ela vivia à base de remédios e calmantes para
aplacar as dores nas costas e as crises de hipertensão que tornavam sua vida um
inferno. Por recomendação médica, começou a caminhar. No início, uma
volta no quarteirão por dia. Aos poucos foi aumentando a distância até que
alguém sugeriu que começasse a correr. Indicada por um sobrinho, passou a
treinar com o técnico Wanderlei de Oliveira, um dos maiores especialistas do
País. Mitiko tinha na época 57 anos. "O efeito mais visível no início foi
a melhora da autoestima", diz Oliveira. "Ela ajudou a derrubar o mito
de que a idade é um fator limítrofe para a prática de atividade física."
Mitiko diz que enfrentou preconceito.
"Quando comecei a treinar em pista, os jovens diziam que eu atrapalhava,
que ali não era lugar para uma idosa", conta.
Com acompanhamento, ela entrou no
circuito de provas de pista e de rua (3 km, 5 km e 10 km) que a credenciou a
voos mais altos. Das três maratonas internacionais que disputou, venceu duas na
sua faixa etária. Seu currículo inclui o bicampeonato mundial master, dez
vitórias consecutivas na tradicional prova da São Silvestre e o recorde
brasileiro dos 800, 1.500 e 3.000 metros. Além de treinos técnicos, Mitiko - um
casal de filhos, três netos e um bisneto - faz musculação e hidroginástica. No
ano que vem, ela pretende abocanhar o tri do mundial master, que será disputado
no Brasil.
Ivone tinha 51 anos quando começou a
praticar exercícios, também por necessidade. Mas aproveitou o conselho do
médico vascular de incluir a natação no tratamento de varizes para lançar um
desafio a si própria: o de aprender a nadar. "Queria usar a piscina de meu
filho e não podia, pois era funda", conta. "Fiquei um ano tendo aulas
num tanquinho. Aprendi e, quando tive segurança, parti para o treinamento
sério."
Em pouco tempo, Ivone passou a
competir em torneios master de natação, acumulando vitórias e recordes pessoais
durante 17 anos. Sua rotina incluía musculação e esteira. Em busca de novos
desafios, decidiu trocar a natação pela corrida de rua. Em dois anos, já
completou cinco meias maratonas - na última delas, há um mês, foi a campeã na
sua faixa etária. Mãe de um casal de filhos, Ivone tem cinco netos e dois
bisnetos. Aparenta bem menos a idade que tem, treina seis vezes por semana -
dois deles na piscina - e reclama que é a única da família que pratica
exercícios. "Falei para o meu filho, que acaba de fazer 52 anos, que
comecei na idade dele. Ainda dá."
Carga. Daphinis praticou
atletismo na juventude, mas caiu no sedentarismo depois que começou a trabalhar
como autônomo. Ele só saiu da mesmice aos 56 anos, quando passou a nadar à
noite numa academia perto de casa, sem maiores pretensões ou acompanhamento.
Aos 75, mudou de bairro e de academia, matriculando-se na Competition, onde foi
estimulado a treinar sob supervisão de especialistas.
Ele admite que enfrentou preconceito
de amigos próximos, que consideravam a carga de treinos pesada para sua idade.
"Falavam que fazer exercício é muito chato, uma perda de tempo para quem é
velho", diz. Daphinis lamenta que todos eles já tenham morrido. "Eles
se foram e ainda estou aqui."
Disciplinado, Daphinis acumulou mais
de 50 medalhas em provas e ainda conseguiu arrastar a família para a prática de
exercícios. A mulher, de 84 anos, nada e faz musculação. O mais velho dos cinco
filhos, hoje com 64 anos, compete em provas de 3.000 m e 5.000 m em mar aberto.
Além deles, uma nora, um neto e uma neta também malham na mesma academia. E
espera um dia acompanhar os três bisnetos. "Já fiz proposta de me mudar
para cá", brinca. Daphinis reclama não ter ninguém de sua faixa etária (85
a 90 anos) disputando provas master de natação. "Meu adversário sou
eu", diz.
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